25 de Novembro – Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres
Hoje é o Dia Internacional para a Eliminação da Violência as Mulheres, é um dia que refletimos sobre este problema mundial e intergeracional. Cada vez mais se verifica, com muita tristeza, vítimas pré-adolescentes. A Organização Mundial da Saúde considera que a violência de género, destaca-se como o maior padrão de violência. Segundo, a Amnistia Internacional, 70% das mortes das mulheres, são pelo seu companheiro. Além de que 30% das mulheres que tiveram uma relação de namoro sofreram violência física e/ou sexual pelo namorado, e 43% violência psicológica. Neste sentido, no ano 2020, APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) apoiou, um total de 13.093 vítimas diretas de violência doméstica, das quais 75% destas eram do sexo feminino. A mesma associação alertou, que o 94% dos crimes cometidos, são contra as pessoas, sobre os quais destaca o crime de violência doméstica que comporta os 72,6% dos casos. Relativamente aos dados sobre homicídios, no ano 2019, foram mortas 29 mulheres no contexto conjugal, segundo a CIG (Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género). Inclusive a UMAR (União das Mulheres Alternativa e Respostas) calculou, que em média, morre uma mulher cada quinze dias, vítima de violência conjugal, em Portugal.
Esta trágica realidade, revela a importância de ponderar algumas questões.
Por um lado, consideramos de extrema relevância relembrar as vias de apoio às vítimas, através dos contactos seguintes 112, 800 202 148, os SMS ao 3060, e a aplicação AppVD. Além do pedido de socorro da vítima é necessário consciencializar a cidadania para prestar ajuda, poder identificar as mesmas e criar um espaço de segurança onde possam refugiar-se.
A cidadania também tem uma grande responsabilidade nesta problemática que cria várias vítimas por dia, incluídas crianças. No entanto, as crenças e valores machistas enraizados na nossa sociedade, às vezes afastam-nos do que é realmente importante, proteger a quem mais precisa. Importa relembrar, que até há pouco tempo, considerava-se que a violência
doméstica e de género eram aceites como algo normal e privado. Crescemos como sociedade democrática, que protege direitos fundamentais, mas é preciso reconhecer que temos um longo caminho pela frente.
O mais relevante aqui, é compreender que o papel da cidadania não é outro que criar um espaço seguro, para quem precise, possa dar um passo à frente, denunciar e pedir ajuda. Por isso é o nosso trabalho individual reduzir a coragem necessária para o efeito, sendo uma sociedade aberta e protetora. Os comentários e juízos de valor, “alguma coisa fez…”, “ela é burra porque não sai de casa ou acaba com ele”, “não sabe por limites”, “ele é assim, e ela já sabia disso”, desumanizam a vítima, atribuindo-a uma responsabilidade que ao mesmo tempo retira-se do agressor. O nosso propósito visa a que a nossa sociedade esteja sensibilizada para a proteção da vítima. Inclusive, por o foco no comportamento da mulher em sofrimento, faz-nos esquecer os sinais de violência que aparecem progressivamente: comportamento agressivo, ameaças, ira, domínio, sentimento de superioridade, intimidação, violência psicológica, física e económica…Esta ideia de progressividade é muito importante. Como podemos compreender, as agressões físicas não acontecem no primeiro encontro. Se assim fosse, é muito provável que a potencial vítima conseguisse identificar o risco e afastar-se do agressor.
Uma questão muito relevante, é não idealizar nenhuma vítima, não deixar-nos influenciar por dramáticos estereótipos, nem julgar, porque as condições psicológicas, físicas, intelectuais e sociais de uma vítima após os maus tratos não estão nas mesmas condições que os seus interlocutores. Não podemos criar um perfil único do que definimos como vítima, esperando que seja alguém “perfeito”, porque a partir do momento em que projetamos sobre a mesma o peso da perfeição, comparamos a vítima com um nível inalcançável de moralidade e inteligência, acabando por desumanizá-la, e para isso já está o agressor.
O ‘círculo ou ciclo da violência’ foi definido na década de 1970 por Lenore E. Walker quem descreve um processo cíclico (que se repete) entre uma agressão e outra. As fases de cada um dos ciclos são três: tensão, explosão e arrependimento ou lua-de-mel. Este processo repete-se, aumentando o nível de tensão e explosão em cada uma das repetições e reduzindo os períodos de lua-de-mel. Estes ciclos de violência causam na vítima perda de autoconfiança, medo, dependência e submissão, até que a faz viver em função do agressor (acredita que ela lhe pertence e faz o que ele manda). Por um lado os golpes, ameaças, gritos, partir coisas, causam intimidação, medo e submissão, a falta de valorização do outro reduz a auto-estima da vítima produzindo insegurança, o despreço pela família e amizades da vítima. O agressor isola a vítima do seu ambiente familiar e de amizades, conseguindo que sinta-se sozinha e dependente do mesmo. Também é muito frequente que o agressor culpabilize a vítima das suas reações violentas, colocando-se na posição de “vítima”, ao mesmo tempo transmitindo-lhe que a mesma deve ser e comportar-se como ele considera oportuno em cada momento. Por último, na fase de lua-de-mel, na qual o agressor tenta desculpar-se pelo seu comportamento, faz que a pessoa agredida sinta-se querida de novo e por amor, decida “lutar” por uma relação com a esperança de que se ela muda, ele ficará melhor. Segundo o critério da vítima, após a manipulação agressiva e passivoagressiva que sofreu, a mesma é responsável das reações que causa no agressor, e não o próprio que é um ser humano adulto que deveria ter capacidade de gerir as suas emoções.
Desta forma a única causa/responsável do comportamento do agressor é a vítima, “ele vai-se zangar se eu… visto-me assim, falo com este rapaz, saio com as minhas amigas (etc..) ”, é uma relação causa-efeito, na qual a vítima é sempre a causa e consequentemente a responsável, nada mais longe da realidade. Por tudo o supra exposto, uma sociedade compreensiva, aberta e consciencializada é imprescindível para a prevenção da violência de género.
Nesse sentido, encontramos um exemplo de implicação social na nossa vizinha Espanha. Os espanhóis, criaram espaços violetas, que são uma rede ampla de lojas, farmácias, restaurantes, bares, lugares seguros e protetores que ajudam as mulheres vítimas ou potenciais vítimas. Esta rede, recebe indicações prévias das autoridades e estão coordenadas com as forças e corpos de segurança. Uma população consciencializada, que prioriza proteger sobre julgar, é sem dúvida um bom caminho para aumentar o número de queixas, reduzir o número de vítimas e proteger aos menores, os quais de forma colateral também são vítimas de maus-tratos.
A PJM Advogados hoje dá um passo à frente, a favor de sugestão da criação de uma rede cívica e institucional articulada, protetora, que envie uma mensagem social clara de tolerância zero à violência de género, reforçando a responsabilidade de cada um de nós para acabar, de vez, com este drama social.
Mariana da Silva Chasco
Jurista